Livro: Elite da Tropa

- Elite da Tropa
- Luiz Eduardo Soares; Andre Batista; Rodrigo Pimentel, 2006.

- Ed. Objetiva

Na primeira parte de nosso especial [A Ética da Malandragem], expomos a decadência moral e ética do topo da Pirâmide do Poder, o Congresso Nacional e todas suas pitorescas "nuances" para usar um eufemismo bem eufemismo mesmo; depois apresentamos aos estimados leitores o segundo livro da trilogia [Gomorra] e agora o desfecho da série "Como Entender o Mundo": Elite da Tropa.

Antes de mais nada, deixei para explicar no último livro o porque da escolha desses títulos específicos para compor a trilogia; além de serem títulos que expunham as vísceras da degradação social, contendo informações valiosas sobre a violência e corrupção que move a Economia dos países capitalistas, os livros reunidos completam considerável parte do complexo e invisível quebra-cabeça que representa o jogo de Poder domado com maestria pelos homens que nós "democraticamente" colocamos no comando de nossas vidas. Todo Estado Moderno tem seu Congresso que não é menos sujo que o radicado em Brasília, apenas bem menos divulgado afinal, não nos interessamos nem pelo que ocorre na vida pública da cidade em que moramos quiçá no que acontece no Congresso dos outros, e o livro A Ética Da... mostra apenas uma beirinha do manto corrompido sobre o qual o mundo está estruturado; já Gomorra... nos fertiliza a imaginação com narrações precisas da logística e metodologia usados pelos mesmos homens que exercem cargos públicos para angariar mais e mais dinheiro e poder só que através do mercado negro, falsificações, drogas ilícitas, venda de produtos roubados, assaltos etc. etc. afinal, o crime também faz parte do sistema capitalista em que estamos inseridos e quem lucra de forma legal, também lucra de forma ilegal.

Se na Europa existe a Itália como paraíso para esse tipo de comércio, na america do norte existe o México, na América do Sul existe o Brasil... Se lá na terra da massa eles tem mafiosos e na america do norte tem-se guerrilheiros comunistas, aqui pra nós sobraram os traficantes pesados, generais do dinheiro sujo comandados pelos homens que fabricam o dinheiro "limpo". Entre aspas mesmo, porque depois de ler esses livros você se perguntará: existe dinheiro limpo? A diferença entre os dois é larga: o "sujo" dá um lucro muito maior... Entendes my amigo?

Enquanto os homens que ocupam o topo da cadeia do poder ganham dinheiro tanto legalmente quanto ilegalmente e nós, simples e reles cidadães nos encontramos absortos, encantados por nossos próprios umbigos, sem disposição nem incentivo nenhum de melhorar sequer nossa vida, quem diria nosso País, nosso Mundo. Aceitamos leis absurdas impostas sempre visando o bolso dos políticos e seus asseclas, pagamos seus impostos astronômicos, não recebemos Saúde, Educação, Segurança, sem ter que desembolsar pequenas fortunas e seguimos nossas vidas agindo como cachorros de madames, sempre quietos e obedientes, comendo o dormindo, esperando apenas a hora da morte, sem influir nem contribuir em nada para o bem comum.

Só quem nem todo mundo se deixa manipular. Alguns começam a pensar: "preciso mesmo estudar e trabalhar tanto pra ter o que esse playboy tem?" "pra que, se tem-se meios mais fáceis!" Sobra então a Mão Forte do Estado, o Poder de Polícia para "apaziguar os ânimos" dos mais exaltados [leia-se aqueles que assaltam, matam, sequestram, extorquem, corrompem, etc. etc. para satisfazer seus desejos materiais]. Elite da Tropa dá uma pincelada no quadro da segurança pública do Rio de Janeiro da década de 90, mas a paisagem formada pela violência urbana pode ser apreciada nos dias de hoje em qualquer cidade brasileira com mais de 40.000 hab. Se na década de 90 a coisa era daquele jeito, imagine então 15, 20 anos depois?

O livro joga uma tênue luz nos bastidores obscuros do círculo dos policiais de alta patente que comandam a Corporação, mais parecem executivos armados. Sentem-se renegados pelos demais pares políticos e por isso, armam um sistema dentro do sistema, assim, mesmo excluídos da maior parte da diversão [roubalheira], eles conseguem ter dinheiro e poder suficiente para dominar localmente e com isso conseguir alianças políticas de peso objetivando, lógico o dinheiro e o poder. Quem sofre as consequências em primeiro plano é a tropa, soldados que estão dia a dia combatendo o crime nas ruas mal sem remuneração adequada e com pessimas condições de trabalho, sem falar nos descumprimentos de vários preceitos Constitucionais como o não pagamento de abono de periculosidade e insalubridade, adicional noturno e muito menos plano de saúde, enquanto seus superiores estão ocupadíssimos não com soluções práticas para as falhas na segurança pública mas sim em como arrumar mais dinheiro e poder para fazer mais alianças políticas e conseguir mais dinheiro e poder num ciclo vicioso.

Assim como o nome do livro foi invertido no filme [Tropa de Elite], a ideia central do mesmo também foi invertida: o objetivo do livro não era narrar as aventuras do herói cap. Nascimento; Elite da Tropa foi escrito pra ajudar a entender a relação polícia-criminoso-sociedade. Se o favelado criminoso é vítima do sistema como prega alguns seguidores de Rousseau [assim como eu], o policial corrupto é vítima do sistema do sistema, ele é vítima duas vezes, uma vez que além de lidar com os bandidos ditos comuns, ainda tem que lidar com os bandidos que os comandam, que dirigem seu meio de vida, onde uma simples reclamação por melhorias no ambiente de trabalho pode virar uma briga de cunho pessoal desbocando em morte, afinal todos tem armas nas cinturas. Extorquir motoristas irregulares, pegar "arrego" do tráfico, vender armas, etc. é a válvula de escape daqueles que se sentem mais roubados pelos políticos do que os cidadães comuns, pois a materialização de Estado de Direito é feita por eles. Por conviver com os 2 tipos de criminosos, o de colarinho/estrela doudara/toga e o de chinelo havaiana, o policial corrupto se sente acima de todos sendo legislador, executor e julgador do cidadão infrator. Para frear essa mórbida interação social foi necessário, naquela época, a criação de uma polícia da polícia; e o que foi solução por algum tempo, transformou-se em apenas mais uma arma do sistema para equilibrar as forças negativas que regem o próprio sistema. O filme baseado no livro foi romanceado em demasia. O cap. Nascimento do livro não tem muito haver com o interpretado pelo Wagner Moura. Ele não é héroi e sabe disso. Ele era apenas mais um homem tentando sobreviver dignamente dentro de um mundo indigno.

Existe um Ética da Malandragem, um Gomorra e um Elite da Tropa deixando o mundo fictício da Literatura e sendo posto em prática no dia a dia, na nosso Estado, no nosso País, no nosso mundo. Ou melhor, deixando não, pois o livro não deu origem as Instituições do Poder e suas falcatruas. Foram as Instituições de Poder que deram origem aos livros.

Aqui a vida não imita arte, a arte imita a vida retratando de forma real, dura e crua as dinâmicas dos Poderes destroem vidas, roubam, manipulam e sempre permanecem intactos, graças em grande parte por culpa de nossa inércia política que já temos entranhada em nossos ossos desde nossos antepassados mais longínquos aliada aos interesses pessoais e egoístas que levam o homem desenvolver uma cobiça, uma ganância por dinheiro e poder sem tamanho, não importando os meios usados para alcançar seus vaidosos objetivos escusos.

Walter A.
wjr_stoner@hotmail.com / @walter_blogTM

Comentários

Wenndell Amaral disse…
Realmente, são três livros obrigatórios para um choque de realidade ou fugir um pouco da ficção. Vale a pena.