FILME: HELENO, O PRÍNCIPE MALDITO

- Heleno O Príncipe Maldito, 2012
- Dir.: José Henrique Fonseca
- Com: Rodrigo Santoro, Aline Morais, Othon Bastos
- Dur.: 116 min.

A película é uma cine-biografia de um dos primeiros grandes craques do "panteão" (caso existisse) do futebol nacional. Se hoje existem jogadores polêmicos [Adriano, Edmundo, Robinho, Balotelli, Maradona, entre tantos exemplos] que exibem uma vida desregrada, repleta de prazeres carnais, Heleno é o precursor de todos. Nascido aos 12 dias de fevereiro do ano 1920 em São João Nepomuceno, interior de Minas Gerais, Heleno de Freitas foi advogado, boêmio e principalmente, jogador de futebol. Iniciou sua breve carreira aos 20 anos no clube de seu coração Botafogo de Futebol e Regatas.

O filme nada contra a corrente em diversas frentes: sua fotografia é inteira em preto e branco, a primeira vista pode espantar quem não gosta de futebol, porém desde já resguardo que Heleno, O Príncipe Maldito não é um filme sobre futebol e sim sobre pessoas, trazendo em sua essência uma história de vida que poderia ser enredo sobre a trajetória de diversos outros grandes jogadores de futebol. Heleno personificou a virtude - naqueles tempo áureos do futebol - de honrar a camisa de um clube até a morte.

Heleno no auge: drogas, bebidas e mulheres eram seus passa-tempos
Traçando um caminho da realidade recortada daqueles anos 40 na cidade do Rio de Janeiro em forma de flashbacks, ponto fraco do filme para alguns já que certas omissões não passam despercebidas (como a não citação a doença que o matou), o diretor José Henrique Fonseca se desdobra para resumir a curta vida daquele gênio da bola em algumas centenas de minutos. Méritos para o trio de roteiristas: Felipe Bragança, Fernando Castets e o próprio diretor José Henrique que conseguem uma sincronia ímpar nesse gênero biográfico dentro do cinema nacional. Ótimo ator, Rodrigo Santoro contribui de maneira positiva tanto no aspecto dramático de sua atuação em si quanto fisicamente, acompanhando a fisionomia e porte físico do personagem com conformidade com suas respectivas épocas; da saúde de ferro em seu auge até a decadência no fim da vida esquecido num sanatório mineiro.

Santoro encarnando Heleno em meio a fotografia classe A do filme
A trajetória de Heleno de Freitas serve de mote para explicar o por que do futebol, ao conseguir trazer a Copa para cá após tantos anos, encontra-se em em franca decadência técnica, física e estrutural graças a gestões de verdadeiros ladrões de bola, com o perdão do trocadilho infame. Tirando proveito a fidelidade de Heleno, após o Botafogo perder um título para o rival Fluminense, os dirigentes alvinegros decidem junto com os advogados e empresários vender Heleno para o Boca Juniors da Argentina sob a desculpa de "salvar as finanças do clube". Ludibriam o craque que encontrava-se em mal momento profissional.

Heleno foi vendido ao futebol argentino como a maior negociação já feita até aquele momento no futebol brasileiro, movimentando cifras milionárias (incrível como os fatos se repetem). Longe de seu clube de coração, de sua mulher e de seu filho recém nascido, o jogador entra em decadência e se entrega aos prazeres ilusórios introduzidos pela fama, dinheiro e poder. Um país que nunca zelou pelos seus verdadeiros ídolos, que sempre enxerga em vez de homens talentosos, pilhas de dinheiro, demonstra que desde sempre as virtudes brasileiras estão deturpadas. Com os ídolos não podia ser diferente.

Um império foi criado em cima de histórias tristes como a de Heleno de Freitas e tantos outros brasileiros, jogadores de futebol ou não. Um império bilionário fundado na mentira, manipulação e busca do lucro fácil e incessante em detrimento do ser humano que ama aquilo que faz. Observando os jogadores de futebol, conhecendo suas histórias, conseguimos ver quem são e como deixam destruir por empresários e dirigentes corruptos,  uma das poucas manifestações culturais que ajudam a solidificar a identidade de um povo. O Brasil é hoje a imagem e semelhança desses animais engravatados, a imagem do roubo.
Exaltar uma copa feita num Brasil carente em tudo, é mais que utopia. É um crime. Mais isso é outra história, de outros textos.


A exponencial evidência da seleção brasileira em ano de copa em terra brasilis, os clubes aparentemente tomaram um banho de realidade financeira, ao contrário do governo Dilma. Se os clubes suprimiram grandes contratações e investimentos em suas categorias de base, foi porque a Receita Federal, para angarias verbas para financiar os magnânimos gastos com estádios sem importância econômica (a não ser para alguns empresários), começou a exigir a quitação das dívidas fiscais milionárias daqueles. Dentre os chamados "grandes" o Botafogo é o que vive situação mais danosa, detendo o maior dívida com o fisco: cerca de 500 milhões de reais, excluindo-se os juros. Com os juros, a dívida salta para a absurda cifra de R$900 milhões.

Se na política brasileira os gestores colocam um primeiro lugar sua vontade privada em detrimento do bem coletivo, no futebol não poderia ser diferente. O Botafogo de Heleno, de Garrincha, de Nilton Santos, dividia com o Santos de Pelé a hegemonia do futebol brasileiro. Durante esses anos áureos, o Botafogo serviu como base para a Seleção Brasileira na conquista de seus primeiros títulos mundiais. Como um clube com tamanha história. celeiro de craques nacionais como Zagallo, Jairzinho, Manga fora os já citados, encontra-se em 2014 arriscado a fechar as portas? Assistindo a Heleno, com sua bela fotografia e produção, possível começar a perceber que a ganância de uns transformou o esporte de tantos em mero entretenimento simulado. Porém capaz de gerar bilhões.
 

Walter A.
wjr_stoner@hotmail.com / facebook.com/walterblogTM

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